Fabio Nogueira*
Até recentemente, muitos especialistas previam o fim dos supermercados físicos após o surgimento das compras online e dos sistemas de entrega rápida. A pandemia ajudou a acelerar essa percepção ao forçar todo mundo, literalmente, a migrar para os apps. Adicionalmente, pesquisas internacionais feitas entre jovens da geração Z – a turma abaixo dos 26 anos – indicavam que eles não viam razão alguma para perder tempo indo a um gigantesco centro de compras sendo que tudo o que precisavam podia ser entregue em casa, por praticamente o mesmo preço e até mesmo com agendamento de horário
Mas essa nunca foi a opinião do público maduro. Ir ao supermercado é visto como distração, passeio ou oportunidade de sociabilização. Quanto mais madura a pessoa, maior o prazer de ir fazer compras (e de ir a agências bancárias também, pelo mesmo motivo). Com a sociedade planetária envelhecendo, tanto pelo aumento da expectativa de vida quanto pela forte redução no nascimento de crianças, os empresários se aperceberam que havia oportunidade para os serviços de conveniência e também para lojas-conceito focadas no público maduro. E assim começaram a surgir os supermercados desenhados para seniores.
Varejistas tem pouco poder para mudar marcas ou desenvolver novos produtos mas podem melhorar incrivelmente a experiência de compra de seus clientes. E o que a experiência ensinou aos supermercadistas europeus e asiáticos é que algumas medidas simples trazem ótimos resultados. Aqui vai uma lista delas:
- Corredores largos e sinalização clara, facilitando a mobilidade e a identificação dos produtos
- Iluminação brilhante: bastante útil para pessoas com alguma deficiência visual. Alguns mercados de São Paulo, especialmente os direcionados a público de maior poder aquisitivo, tem projeto de iluminação sofisticado, direcionando a luz para os produtos nas prateleiras e mantendo os corredores um pouco mais escuros. Fico lindo de se ver mas inadequado para ler rótulos pequenos.
- Eliminação das prateleiras muito altas e daquelas próximas ao chão. Prateleiras muito altas são inacessíveis ou os produtos caem sobre as pessoas. Prateleiras próximas ao chão forçam a pessoa a se abaixar, o que pode provocar tonturas.
- Áreas de convivência: criar pequenas áreas de descanso por toda a loja garante às pessoas mais velhas a possibilidade de fazer uma pausa para descansar.
- Acompanhamento: ter alguns funcionários simpáticos disponíveis para ajudar os maduros encontrar produtos, pegar itens mais pesados nas prateleiras ou empurrar os carrinhos torna a experiência de compra muito mais agradável. Na Ásia os supermercadistas contratam estagiários, que não apenas ajudam os clientes nas tarefas de compra como também conversam com eles
Itens adicionais que podem ser incluídos no projeto do novo ponto de venda:
- Acessibilidade para cadeirante e pessoas em geral com dificuldade de locomoção, um amplo grupo que incorpora obesos, pessoas com problemas nos joelhos, mães com crianças de colo e idosos. Lembrando que a acessibilidade, para uma pessoa com problemas de locomoção, começa na porta da sua residência.
- Piso antiderrapante
- Realidade ampliada: extremamente útil para ler textos impressos em embalagens pequenas, que são muitas
- Lupas: na falta de realidade ampliada, a velha e boa lupa quebra o galho.
- Carrinhos de compras assistidos, que possuem rodas maiores, alças confortáveis e assentos embutidos para descanso durante as compras.
- Seções especializadas: aglutinando produtos comumente adquiridos por pessoas mais velhas, como um corredor de saúde e bem-estar com vitaminas, suplementos e itens de higiene pessoal. Ou a seção netinhos, já que as pessoas maduras gastam mais dinheiro com os netos do que consigo próprias
- Sossego: elimine a música ambiente. Acredite: apenas cérebros jovens conseguem conviver com várias fontes de ruído simultaneamente sem sofrer um ataque histérico
- Estacionamento: aumente o número de vagas para idosos e pessoas com deficiência.
- Entrega em domicílio: carregar sacola para casa pode ser desconfortável e perigoso. Um simples serviço de entrega domicíliar resolve o problema
- Banheiros visíveis e acessíveis
- Check-outs lentos. É sabido que todo cliente adora zanzar pela loja fazendo suas compras mas odeia ficar 5 minutos parado na fila do caixa. Por isso todo supermercadista faz de tudo para que o atendimento dos caixas seja rápido. Entretanto, para o cliente maduro a expectativa é exatamente a oposta. Ele adora ficar batendo papo com o caixa, gerando o famoso slow checkout. Há o caso bastante conhecido da rede de supermercados holandesa Jumbo, que instalou o que eles chamaram de “Kletskassa”, cuja tradução literal para o inglês é chat checkout. São caixas para pessoas que não tem pressa e são atendidas por funcionários que adoram papear. Se você já fez compra em algum supermercado em Salvador, vivenciou algo semelhante
Agora vem a dúvida clássica de todo supermercadista. Ao reduzir o tamanho das prateleiras e alargar os corredores, o espaço de venda diminui bastante, teoricamente reduzindo a venda por m2 e o número de skus nas prateleiras. Além disso, reduzir o tempo de atendimento no caixa fará com que mais checkouts tenham de ser instalados na loja, significando mais investimento e custo de mão de obra. À primeira vista, nossa loja modelo seria um desastre econômico
Mas não é o que a realidade vem mostrando. Na Ásia, segundo dados de antes da pandemia, supermercados para idosos tinham ticket médio 40% mais alto do que lojas convencionais. E a rede Jumbo ficou tão satisfeita com os resultados da loja piloto que mandou imediatamente instalar as Kletskassa em 200 de seus 700 supermercados
Em poucas décadas, o Brasil terá mais pessoas acima de 50 anos do que entre 20 e 49. Ou seja, é inevitável que o varejo supermercadista se adapte ao novo perfil do consumidor. Que tal começar já?
*Fábio Nogueira é CEO do Observatório da Longevidade, Vice-Presidente da ADVB, Conselheiro e Mentor. Parceiro de conteúdo da Longevidade Expo+Fórum, o Observatório da Longevidade é uma instituição com 29 anos de mercado, focada em prestar serviços de consultoria estratégica e mercadológica (estudos estratégicos de mercado, clusterização, perfil de consumidor, estratégias de penetração, canais de distribuição, branding e gestão de marcas, etc) baseados em pesquisas e informação proprietária. Recentemente criamos o Instituto Observatório da Longevidade, um Think Tank que estuda a Economia Prateada e a interseccionalidade entre longevidade e quatro outros vetores de inclusão: afrodescendentes, LGBTQIAPN+, PcDs e universo feminino. Visite nosso site: observatoriodalongevidade.com.br
(Imagens: Divulgação)