Fabio Nogueira*
O IBGE recentemente divulgou os primeiros dados do censo realizado em 2022. A mídia, de modo geral, chamou a atenção para o fato da população ser menor do que as projeções previam e de que a população afrodescendente ter aumentado sua participação na população total. Fatos importantes, sem dúvida. Mas deixaram de destacar o aspecto mais relevante de todos, em uma ótica de longo prazo: o rápido envelhecimento populacional.
Para a gente ver o tamanho da encrenca em que o país está se metendo, vou destacar alguns poucos números calculados pelo IBGE. Nos próximos 20 anos:
- A população de 0 a 19 anos irá diminuir de 60 milhões para 48 milhões de indivíduos
- A população de 20 a 49 anos irá diminuir de 98 milhões para 86 milhões de pessoas
- E a quantidade de pessoas acima de 50 anos irá aumentar de 54 milhões para 98 milhões de brasileiros
Em outras palavras, a população infantil e os adultos jovens encolherão em 24 milhões de pessoas, enquanto a população madura e velha aumentará em 44 milhões.
Parece que ninguém neste país está a perceber que esta brutal mudança da demografia, que ocorrerá em apenas 20 anos, tem impactos nas cidades, na política, na saúde, na educação, no mercado de trabalho, no mercado de consumo, no tecido social e em qualquer outro aspecto que se possa imaginar.
População jovem encolhendo significa menor necessidade (e venda) de maternidades, pediatria, creches, escolas, material escolar, roupa infantil, moda adolescente, bufês infantis, viagens com os pais e games.
População adulta encolhendo significa menor demanda por vagas na universidade, venda de carros, baladas, moda jovem, viagem de intercâmbio, bebidas prontas, casamentos, festas, vendas de apartamentos pequenos, viagens com crianças pequenas e academias de ginástica.
População madura dobrando de tamanho significa um aumento extraordinário no consumo de serviços de geriatria, cuidados com a saúde, restaurantes, slow travel, moda madura, cultura, transporte coletivo, tecnologia acessível, produtos de conveniência para a idade, residenciais com serviços de hotelaria, residenciais com suporte à saúde, dentre outros produtos e serviços de interesse dessa faixa etária.
As cidades terão de se adaptar a uma população que tem menos pressa e que não aceita com facilidade conviver com sujeira, buracos nas calçadas, desrespeito no trânsito, transporte coletivo ruim e impessoalidade.
O envelhecimento populacional previsto significa 44 milhões a mais de eleitores velhos, contra 24 milhões a menos de eleitores jovens. Eleitores jovens costumam votar em progressistas. Eleitores velhos gostam de votar em conservadores. Adivinha o que a mudança demográfica promoverá em Brasília nas próximas duas décadas?
O mercado de trabalho sofrerá um impacto semelhante. Nos dias atuais, a força de trabalho é composta por 98 milhões de adultos entre 20 e 49 anos, mais uma parcela dos 54 milhões de maduros. Essa parcela não é muito alta porque as estatísticas indicam que o idadismo está na raiz de uma taxa de desemprego de 40% entre a população madura. Portanto, os postos de trabalho existentes são ocupados essencialmente por adultos jovens.
Daqui 20 anos, porém, essa população de adultos jovens terá encolhido para 89 milhões de pessoas. E a de maduros terá se expandido para 93 milhões de indivíduos. Como, por essa época, a expectativa de vida estará por volta de 86 ou 87 anos, os maduros estarão trabalhando até uma idade bem avançada. Isso significa que a força de trabalho será composta, grosso modo, por adultos jovens e maduros em igual proporção.
Fabio Nogueira
E é aqui que mora o perigo: o índice de escolaridade entre as pessoas maduras é bem inferior ao da sociedade como um todo. Um levantamento feito poucos atrás indicou que a escolaridade média dos brasileiros acima de 60 anos é de 7 anos. Eles nem completaram ensino fundamental. É claro que o tempo médio de estudos vem aumentando para todas as faixas etárias. Entretanto, sem um processo formal de recapacitação de adultos, daqui 20 anos, os adultos jovens de 2043 continuarão tendo vários e vários anos de escola a mais do que os maduros de 2043. Então teremos uma população economicamente ativa onde a metade mais jovem terá um grau de escolaridade substancialmente maior do que a metade mais madura. Não precisa ser adivinho para concluir que a produtividade média da economia, que já é péssima, irá cair ainda mais.
O Brasil precisa desenvolver e implantar urgentemente um programa de educação adulta continuada, de modo a capacitar melhor a população que tem 40 anos hoje e terá 60 anos em 2043, ainda em plena atividade profissional. Essa não é uma responsabilidade que se possa delegar ao próprio interessado. As pessoas que estão na base da pirâmide social (que são a grande maioria, em todas as faixas etárias) não tem como investir dinheiro do bolso na própria educação. Essa é uma responsabilidade intransferível do governo.
É fundamental que a sociedade comece a discutir seriamente onde colocar os poucos recursos financeiros disponíveis. Educação é sempre uma boa aposta. Neste caso em particular, é mais do que uma simples opção: é uma necessidade de vida ou morte para a nação.
Fabio Nogueira
*CEO do Observatório da Longevidade, Vice-Presidente da ADVB, Conselheiro e Mentor. Parceiro de conteúdo da Longevidade Expo+Fórum, o Observatório da Longevidade é uma instituição com 29 anos de mercado, focada em prestar serviços de consultoria estratégica e mercadológica (estudos estratégicos de mercado, clusterização, perfil de consumidor, estratégias de penetração, canais de distribuição, branding e gestão de marcas, etc) baseados em pesquisas e informação proprietária. Recentemente criamos o Instituto Observatório da Longevidade, um Think Tank que estuda a Economia Prateada e a interseccionalidade entre longevidade e quatro outros vetores de inclusão: afrodescendentes, LGBTQIAPN+, PcDs e universo feminino. Visite nosso site: observatoriodalongevidade.com.br