Em entrevista especial à Longevidade Expo+Fórum, Martin Henkel, fundador da SeniorLab, parceiro de conteúdo da Longevidade Expo+Fórum, fala sobre as dificuldades do mercado em entender e atingir o público longevo. Além disso, o especialista projeta cenários positivos para o avanço da Economia Prateada nos negócios e na sociedade, uma vez que a longevidade se torna cada vez mais alcançável no Brasil e no mundo.
Henkel é um dos panelistas do evento, que acontece de 29 de setembro a 1 de outubro, no Expo Center Norte, em São Paulo. Veja a programação no site do evento e aproveite para fazer a inscrição online e garantir a sua participação.
A Economia Prateada, aliás, é um destaques da edição deste ano da Longevidade Expo+Fórum. Além de ganhar um fórum dedicado exclusivamente ao assunto, o evento tem ainda como meta difundir e ampliar o alcance da Silver Week, uma semana de descontos, atividades e atrações dedicadas ao público 50+, que tem como principal objetivo informar e proporcionar novas oportunidades de negócios para consumidores e varejistas.
Durante a conversa, Henkel falou sobre estratégias de marketing voltadas à população sênior, características especiais desse grupo e reforçou a importância da compreensão e respeito à diversidade das longevidades existentes, além do combate aos estereótipos e ao etarismo.
De acordo o IBGE (Instituto Nacional de Geografia e Estatística), o Brasil tem hoje 17% da população brasileira na casa dos 60+, público que, segundo Martin, soma 1 trilhão e 300 bilhões em renda, resultando em um público consumidor em potencial ascensão.
Martin é fundador da SeniorLab Mercado & Consumo 60+, professor na Fundação Getúlio Vargas; criador do conceito Aging in Marketing e colunista em revistas e jornais no Brasil e em Portugal, além de reunir vasta experiência de mercado em grandes marcas e corporações.
Qual o cenário atual do mercado voltado para o público longevo no Brasil?
Martin Henkel: Estamos vivendo um momento inédito, tem muita coisa acontecendo. É um tema que vem sendo reproduzido de forma positiva e tem gerado grande impacto no mercado. A partir dessa boa repercussão, as marcas e serviços começam a se aproximar desse grupo.
Vale ressaltar que esse mercado não foi descoberto agora, ele sempre existiu. A renda da população 60+ no Brasil em 2022 foi de R$ 1,3 trilhão, entre aposentadoria, pensões, investimento e outras fontes. Essas pessoas consomem e vale ressaltar que esse grupo foi extremamente importante durante a pandemia, sustentando familiares que não puderam trabalhar. Por isso, o mercado vem buscando estreitar laços e melhorar a relação com esse público.
Considerando as iniciativas de comunicação e interação com esse público, como o Brasil está em relação a outros países?
Martin Henkel: Depende da ótica. Não adianta oferecer soluções que estão desconectadas do momento atual do consumidor. Existe um ecossistema de inovação que vem produzindo soluções absolutamente novas, mas que ainda não são percebidas e valorizadas pelo consumidor. É a arte de achar a solução certa, para o público certo, na hora certa.
Nos Estados Unidos, por exemplo, o consumidor maduro está em uma fase de entendimento de si e do futuro bem mais adiantado do que outros países. Para se ter uma ideia, um norte-americano médio já está planejando aos 55 anos de idade onde e como vai morar na sua velhice. O entendimento e o autoconhecimento sobre as fases do envelhecimento estão mais amadurecidos.
Na Finlândia, tive a oportunidade de conhecer a coordenadora de uma ação que mantém os longevos acompanhados e monitorados em suas residências, que foram totalmente adaptadas arquitetonicamente e tecnologicamente para permitir o aging in place pelo maior tempo possível antes de ser necessária a institucionalização em ILPIs (Instituições e Longa Permanência de Idosos), que, no caso desse país, mais parecem resorts, completamente, da visão que temos de residencial para idosos.
No aspecto de investimento imobiliário privado, o Brasil está vivendo um crescimento de empreendimentos que vão de Senior Livings às clássicas ILPIs, mas com estrutura e serviços bastantes adequados aos novos desejos dos residentes.
Por que o mercado tem dificuldade de se comunicar e pensar estrategicamente o grupo sênior?
Martin Henkel: Desinteresse e dificuldade de pensar estrategicamente são os principais dificultadores das marcas, o que não nos coloca em um cenário confortável. A falta de entrosamento com o público sênior, em sua maioria, se dá pelo desconhecimento do que esse grupo deseja, o que é um problema.
Quando comecei nesse segmento, há dez anos, fui buscar respostas na medicina sobre os desafios para me aproximar desse grupo, então, compreendi que as questões naturais do envelhecimento impactam nessa comunicação. É mais complexo do que se pensa, pois estamos falando de linguagem e didática adequados para essas pessoas. Por isso, devemos trabalhar incansavelmente para mitigar os riscos de perda nessa comunicação.
Por outro lado, há também a falta de interesse de muitas empresas, o que eu particularmente atribuo a questões pessoais dos profissionais que cuidam da área de marketing. Envelhecimento não é um tema sexy, porém é uma realidade e essa população consome e continuará consumindo. Novamente, esse público soma mais de R$ 1 trilhão em renda, logo, parte disso vai para consumo. É um potencial gigantesco que precisamos trabalhar melhor.
Como você vê a importância do público longevo no mercado consumidor atual?
Martin Henkel: É preciso estar atento: as cidades de Porto Alegre e Rio de Janeiro têm hoje mais pessoas com 60 anos ou mais do que crianças e jovens de 0 a 19 anos. O Brasil terá em 2030 mais idosos do que jovens. Já é uma realidade em outras cidades. Não podemos esperar o país todo atingir esse formato para reagir.
As marcas precisam se posicionar, entender esse mercado e, quando falo entender, não é desenvolver produtos para os longevos, mas sim produtos que atendam seus desejos e necessidades e que serão consumidores por eles. Isso gera uma gama enorme de possibilidades em diversos segmentos, como design, tecnologia, comunicação etc. O que importa aqui é a comunicação e o respeito com esse público, que é muito racional e exigente.
Quais são as características do público longevo que tornam o processo de conquista desafiador para mercado e para os profissionais de marketing e publicidade?
Martin Henkel: Uma das principais características e desafios é que esse grupo sênior é extremamente racional. Esse é o público menos alcançável pelas decisões de compras por impulso.
Para vender para longevos, é necessário menos apelo emocional. Antes da compra, geralmente os 60+ se perguntam: ‘Eu realmente preciso disso?’, ‘Esse valor está adequado?’, ‘Essa loja/marca me respeita enquanto consumidor?’. Eles também têm um perfil decisivo, ou seja, entram no estabelecimento já certo do que querem comprar. É um consumidor que traz novos desafios para o profissional de marketing, com certeza.
A diferenciação entre as faixas etárias é importante para o sucesso de marcas que apostam nesse público? Se sim, por qual motivo?
Martin Henkel: A segmentação de faixas etárias é muito importante, porque precisamos identificar o público e o que queremos vender para ele. Falar 60+ soa como uma forma simplista. Inclusive, achar que todas essas pessoas são iguais pode ser uma armadilha para quem não vive esse ambiente. Não são. Cada faixa etária tem seus desejos e condutas distintas. São muitas formas de viver e experimentar a longevidade.
A SeniorLab fala muito da importância do aging in marketing, que é o olhar e expectativa do público em relação àquele produto. Nesse ponto, reforço novamente a necessidade de ajustes de comunicação, linguagem, layout, apelo, tudo voltado para o público que vai consumir isso.
Há fases da longevidade nas quais o perfil de compra se assemelha muito ao dos jovens e há fases onde há maior necessidade de produtos mais assistenciais. Ainda temos um outro ponto nesse tema, que é quando um 60+ decide a compra de um produto para outro longevo, o que chamamos de geração sanduíche. O aumento da longevidade nos traz esses desafios e nos convida a pensar em novas estratégias.
Na sua visão, como os estereótipos e preconceitos em relação ao envelhecimento afetam as estratégias de marketing voltadas para o público longevo?
Martin Henkel: A falta de observação, o desconhecimento e a ausência de assessoria especializada sobre esse mercado podem causar grandes estragos nas estratégias de marketing de empresas. Um exemplo de erro muito comum é não colocar o longevo como tomador de decisão.
Além disso, é importante que os profissionais de comunicação e marketing não caiam na armadilha dos superidosos. O envelhecimento causa desconforto para algumas gerações, por isso, eles acabam não encarando esse mercado de frente e deixam os preconceitos tomarem conta do processo, contaminando as estratégias de comunicação. Quando isto ocorre, eles projetam o ideal no superidoso, aqueles que fazem coisas extraordinárias como pular de paraquedas. Mas, a verdade é que o longevo médio não é assim, é um outro comportamento, muito distante desses que são um ponto fora da curva. No futuro talvez tenhamos mais pessoas com esses traços, mas agora isso ainda não reflete a maioria. Hoje, é preciso ter cuidado para não nos afastarmos demais da vida como ela é.
O que esperar do futuro das marcas e do mercado nesse sentido?
Martin Henkel: É importante sinalizar que hoje há um movimento bastante consistente de marcas que estão fazendo ou buscando fazer a coisa certa. A tendência é que o mercado esteja cada vez mais alinhado com o tema, por questões demográficas e sociais. Até porque ninguém vai querer perder o bonde. Há muita oportunidade nesse nicho, por exemplo, invariavelmente o shopping é 60+. Esse público está nos shoppings e possui um ticket superior ao ticket médio. Veja como o desconhecimento e o preconceito podem atrapalhar as marcas e as vendas na ponta, no varejo.
Qual o papel da SeniorLab nesse contexto?
Martin Henkel: A SeniorLab completa no início do ano que vem 10 anos de atividade. Começamos em um mercado onde ainda se falava “terceira idade”, mas que com o tempo foi migrando e evoluindo para outras nomenclaturas. Realizamos projetos em grandes companhias dos mais diversos segmentos, como seguros, previdência privada, indústria, hospitalar, varejo, onde conseguimos agregar conhecimento e melhorar a relação dessas instituições com o consumidor. Nossa missão é ajudar nesse aprimoramento, além de colaborar para a diminuição do tempo da curva de aprendizado das empresas.
Ao longo dessa jornada, nos deparamos com situações nas quais não é necessário formar um novo produto, mas sim adaptar o existente para as necessidades e sintonia com esse público. É uma economia de tempo e dinheiro a partir do conhecimento.
Ainda há muito a fazer, outras etapas devem ser adicionadas, mas, o que as pesquisas mostram hoje é que esse consumidor está cansado de ficar na vitrine. ‘Parem de me olhar como se eu fosse um objeto. Ofereçam coisas para mim, para que eu possa experimentar, avaliar, criticar e que ajudem a melhorar esse mercado’.
Ao final da entrevista, Martin Henkel reforçou a necessidade da quebra de paradigmas e estereótipos, além do combate ao idadismo. Ele citou uma pesquisa da SeniorLab em conjunto com a plataforma Deezer para descobrir as preferências dos 60+ em termos de música e podcasts.
Segundo Martin, os resultados contrariam totalmente os estereótipos populares. “O sertanejo está ganhando de lavada no quesito música. É o gênero mais ouvido por 60% dos 60+ na plataforma. Nos podcasts, entre os 20 mais ouvidos por essa população, não há nenhum sobre saúde. A prevalência é o de informações sobre o cotidiano, esoterismo e bem estar. Há uma atitude muito positiva dos 60+ em relação à felicidade”.
Conheça os 5 passos para que empresas tenham mais sucesso no relacionamento com o público longevo, indicados por Henkel.
1 – Contexto demogáfico: Perceber o contexto demográfico 60+ nacional e as suas regiões de atuação. Analisar com olhar crítico informações e dados, números e verdades equivocadas de mercado que acabam sendo repetidas sem a devida checagem. Muitos planos de negócio naufragam por estarem baseados nos mapas e bússolas erradas.
2 – Impacto do público no seu negócio: Mensurar o quanto o consumidor 60+ representa no seu negócio e, desta forma, encontrar as oportunidades de expansão desta participação.
3 – Desmistificação de preconceitos: Atualizar a visão, o conhecimento e desmistificar preconceitos das áreas e times que desenvolvem e aplicam as estratégias de desenvolvimento de produtos ou serviços na companhia.
4 – Diagnóstico de comunicação: Realizar um diagnóstico de interfaces de comunicação com os 60+, ou seja, entender se canais, linguagem, formatos e estratégias de relacionamento estão adequadas. Como dica principal, aconselho verificar como seu site ou canal de vendas on-line se comporta em modo mobile. A internet para a maioria absoluta dos 60+ é uma tela de 6,5 polegadas de um smartphone.
5 – Observe com a lente adequada: Atualize-se, busque ajuda especializada e principalmente cuidado para não cair no lugar comum do “precisamos desenvolver um novo produto para os 60+”. Na maioria das situações bastam ajustes de design, destaque de atributos já existentes.
(Texto: Aline Porfírio / Imagens: Divulgação)