Por Cristina Sabbag, sócia, CDO e principal Researcher da Talento Sênior
O país já ultrapassou os 54,8 milhões de pessoas acima dos 50 anos. São mais de 28 milhões de idosos (acima de 60 anos). A expectativa é que esse número dobre de tamanho nas próximas décadas, de acordo com as estatísticas do IBGE (2018). Em 2050, o Brasil será o 6º país com a maior população idosa do mundo, na frente de outros países desenvolvidos.
Pela primeira vez na nossa história, a população com mais de 60 anos, é maior que a de até 5 anos. Em 2030, teremos mais idosos do que pessoas com até 14 anos. Para esse aumento da longevidade, o desafio do mercado de trabalho tem sido em dar continuidade à jornada profissional desses profissionais maduros, que esbarra em três mitos a serem combatidos:
- Não podem trabalhar;
- Não é potente como consumidor;
- Não gosta de tecnologia
Para cada um desses mitos já existem um ‘sem número’ de estudos e pesquisas que comprovam exatamente o contrário. De acordo com um estudo do DIEESE elaborado com base nos dados da PNAD Contínua (IBGE) a população considerada idosa (60+) representa 17,9% dos brasileiros. Uma taxa expressiva e que evidencia a importância dos idosos para a economia do país. Porém, apenas 18,5% estão trabalhando. Onde estariam os outros quase 82% senão buscando emprego ou tentando empreender, já que cerca de 75% deles contribuem com a renda da casa.
Esse é um sinal de que tem muito profissional produtivo e especializado nesse universo, que segue ignorado pelo mercado de trabalho. A barreira do preconceito afasta as oportunidades de profissionais maduros e experientes continuarem sua jornada profissional e, consequentemente, de consumirem e se desenvolverem.
Segundo o estudo “Tsunami Prateado”, realizado pela Pipe . Social e Hype60+, esse é um público que vive com seu próprio dinheiro. Os dados apontam que 86% das pessoas 55+ e 93% das pessoas 75+ possuem renda própria. Mas o aumento de custos com saúde e ajustes financeiro às novas realidades impõe desafios que precisam ser vencidos. Eles não podem e não querem parar.
Os nossos idosos de hoje estão recebendo os filhos de volta em casa e boa parte deles está garantindo o sustento da família. Assim, provam todos os dias o quanto ainda estão ativos e prontos para o trabalho. É a eles que as empresas vão precisar recorrer. Para isso, é urgente que “enxerguem” as oportunidades do aumento de expectativa de vida do mercado de trabalho à sociedade de forma geral.
Vivendo mais, essa população precisa ser considerada como consumidor e, principalmente, ter produtos e serviços que a atenda. Não haverá outra forma de “abocanhar” essa potente fatia de mercado consumidor se as empresas não aproveitarem essa profissional maduro, de forma atuante nas criações, planejamentos, desenvolvimentos de soluções e produtos que atenderão esse novo mercado que só cresce. É preciso ter mais produtos para eles, sem ser apenas aqueles ligados à saúde.
Ainda no “Tsunami Prateado” os dados indicam que a cada 10 consumidores acima de 55 anos, quatro reclamam da falta de produtos e serviços voltados para idosos; as mulheres são as que mais reclamam (43%).
Especialistas estimam que a chamada “Economia Prateada” — que reúne as atividades econômicas associadas às necessidades das pessoas com mais de 50 anos e os produtos e serviços que elas consomem diretamente ou virão a consumir no futuro – seja talvez a 3ª maior atividade econômica do mundo, que movimenta US$ 7,1 tri anuais. No Brasil, o consumidor maduro movimenta cerca de R$1,6 trilhão por ano, apesar da falta de produtos e serviços criados para eles. Mais uma potente contribuição dessa população que é desperdiçada.
Desafios como criar soluções para integrar diferentes gerações no ambiente de trabalho e gerar resultado, conhecimento e inovação a partir da diversidade etária precisa vencer, em primeiro lugar, a barreira do etarismo, o preconceito a respeito da capacidade de um profissional por conta de sua idade.
Sobre a resistência e as dificuldades com a tecnologia, saibam que os 50+ estão nas redes e consomem produtos digitais. Segundo dados da pesquisa ‘Webshoppers’, os consumidores 50+, pela primeira vez, foram os que mais fizeram compras online em 2021, totalizando 33,9% dos pedidos e ultrapassando os adultos de 35 a 49 anos, historicamente o maior público que compra pela internet, que responderam por 33,2%, segundo a pesquisa.
No mercado do trabalho, em meio a aceleração digital global com a pandemia, as empresas precisam ser cada vez mais tecnológicas. Se o consumidor 60+ estará em maior número no mercado em alguns anos, as empresas vão ter que contar com essa força de trabalho e, além de focar no seu consumidor precisam focar também nos seus talentos tech que vão estar no front e no centro dessa transformação digital.
Segundo um estudo realizado pela Manpower, 42% das empresas no Brasil estão acelerando seus processos de digitalização e automação. Na mesma pesquisa foi descoberto que a tecnologia está criando mais empregos do que suprimindo. O aumento da automação vai rearranjar as atividades e isso vai mexer com o quadro de funcionários. Os colaboradores vão ter que aprender sobre atividades demandadas por empresas mais automatizadas. Porém, essas não podem se eximir da responsabilidade de capacitar seus talentos seja ele jovem, seja 45+. Porque as novas habilidades serão novidades para todos, somente a forma de ensiná-las é que torna o processo mais inclusivo nas empresas.
Rapidamente, as organizações precisam encontrar novas formas de fazer as mesmas coisas e coisas novas. Enquanto isso, os profissionais ativos e os ingressantes têm que se adaptar e passar a dominar esse novo letramento de inovação digital. Assim poderão alavancar as oportunidades online com mais rapidez. As empresas vão precisar de pessoas com conhecimentos diferentes.
Tecnologia é um conceito muito amplo. Um processo novo, um novo jeito de fazer, são inovações que precisam ser implementadas e treinadas e os 45+ não têm medo disso, porém, estão sendo colocados à margem das novas ações por preconceito, por capacitismo.
Hoje, o mercado está em busca das softskills, mas também é importante trazer junto as techskills, porque o grande poder humano vai ser a soma desses dois conjuntos de habilidades. À medida que as empresas se transformam e se tornam digitais rapidamente, em escala, a competência necessária para os trabalhadores também muda.
As chances dos adultos jovens e 45+ se adaptarem a essas tendências que o mercado está pedindo, talvez não seja por meio da faculdade de quatro anos, mas por meio dos cursos rápidos, muitos até gratuitos e que podem contribuir e muito para a qualificação desses profissionais.
Vai ser preciso que o profissional sênior, além do seu conhecimento tácito, esteja atualizado sobre processo Agile, Scrum, e que ele saiba o que é trabalhar com dados. O melhor caminho é entender o quão perto e o quão longe ele está das novas competências.
Mais uma vez, contrariando os preconceitos, esse público se mostra muito mais aberto a experimentar tecnologia. Porém, mesmo com tantos dados que provam o contrário, o mercado ainda atribui a eles a falsa ideia de resistência em aprimorar seus conhecimentos tecnológicos.
Superar estereótipos etários é o maior desejo dos profissionais 45+. Esse deve ser um valor a ser considerado pelas empresas que ainda precisam aprender com essa força de trabalho e como se preparar para esse público. A empresa que não está atuando nesta pauta está deixando de ser humanizada e de colher o melhor fruto da convivência entre gerações. Não está preparada e nem atuante na diversidade real e produtiva.
(Imagem: Divulgação)